28/08/2017

Escritos de estranheza acumulada #1


Tava aqui pensando...
O que sou eu agora? Quando eu cheguei (e parei) aqui?
Conversamos e eu te disse claramente, mas isso não faz diferença agora. Me aprisiono sempre no mesmo lugar seguro. Antes eu pensava que vinha pra cá me esconder. Sempre quis vir, e achei que fosse meu refúgio.
Mas sim. Meu refúgio me aprisionou. Não sei mais sentir.
Não sei pensar sobre o que eu sinto. Não sei dizer. Não sei O QUE dizer. Não agora.
Minha armadura não quer mais me deixar. Enquanto tento, agonizo.
Me debato por todos os lados. Meu corpo não responde. Permanece intacto, insosso.
INERTE!

Enquanto isso, eu grito por poder sentir. Só sentir.
Sem prever. Sem antecipar.
Agonizo, por sentir e não conseguir atravessar a nuvem cinza e sólida, só agonizo.
Não sei o caminho de volta. Nunca antes quis voltar.
Não consigo me soltar. Não consigo não pensar. Nunca antes quis não remediar.
"Muito sensata", vocês dizem.
Talvez eu seja mesmo. Inteireza em sensatez.
Eu chamo de anestesia.
A vida me engole, tritura, me empurra do penhasco. Eu sento na ponta do mundo, e só penso a respeito. Imóvel, Intocável, paralisada.
Agonizando por dentro.
Serena e "sensata" pro mundo.

Mas você já se perguntou de onde veio todo esse SUPOSTO saber acerca da dor e do existir dos outros?
Já parou pra pensar em quantas horas de sofrimento e de corpo dilacerado existem em cada frase de compreensão e assertividade?
Pois é. Agora, eu sou aqui.
Sentada num banquinho de madeira, os pés apoiados num tronco de árvore, meio torta, meio sonolenta. O sol esquenta minhas costas, ao mesmo tempo em que o vento me arrepia o anti-braço com um cuidado quase amoroso. Tenho a melhor vista dessas bandas da cidade bem à minha frente. 4 tons de azul, no mínimo, entre o mar e o céu claro (raridade nos últimos tempos). Abaixo do azul, alguns tons de verde em volta de tudo. Uma igrejinha lá no fundo e umas ruínas antigas no caminho.
Tudo muito aprazível aos olhos de qualquer pessoa.
Algumas pessoas fumam embaixo da sombra das árvores logo a frente.
Quanto a mim. Uma parte da paisagem, apenas. Uma música baixa saindo de dentro da bolsa suja. Invisível. Quase completamente imersa.
Expressão serena, talvez.
O que devem imaginar? Será que se perguntam o que eu tanto escrevo?
Mal sabem eles. Só agonizo.

Enquanto tudo se move lentamente e o meu cabelo dança no vento enquanto deixa passar uns raios que desenham no papel formas quase perfeitas. Imagino que, apenas, faço parte da paisagem, como sempre.
Mas ninguém sabe. Sou só agonia!
O que sinto na pele me atravessa tão forte, tão claro de quase cegar.
Penso sentir tudo tão intensamente, que chega a ser desperdício.
É isso! É isso que talvez eu seja agora.
Um acúmulo indiscriminado dos meus desejos desperdiçados em agonia.

- Chegaram pessoas estranhas e sentaram à minha volta -
Perto demais pra eu ignorar; longe demais pra eu conseguir me fazer presente de fato.
Eles estão confortáveis comigo aqui. Talvez eu possa voltar a fazer parte da paisagem, e compartilhar dos meus cinco minutos de agonia silenciosa, ou só da minha música baixa mesmo. Aparentemente um deles gostou de todas.

Agora, a luz que chega na folha através da sombra do meu cabelo é o que há de mais bonito nessa cena, me fez derramar uma lágrima tão calmamente, que até esqueci que agonizava. É o que suga minha atenção. Merecia uma foto, mas o que eu tenho visto é que as câmeras fazem cada dia menos justiça ao que os meus olhos capturam.
Talvez, mas só talvez, eu seja isso também. ESPECTADORA.
O que de algum modo me autoriza (convenientemente) a não entrar em contato diretamente com o que me toca. E enquanto assisto: Apenas agonizo.

É isso! É isso que sou agora.
A apática agonia espectadora daquilo que me atravessa.
ou,
A estranha encolhida de cabeça baixa,
escrevendo,
no banquinho de madeira,
com o sol no cabelo.


São Lázaro, 28.08.2017

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